Domingo, dia de agosto chuvoso. Eu estou no computador preparando um trabalho de consultoria jurídica sobre energia limpa. Olho pela porta entreaberta e vejo o céu nublado. É Inverno, sem dúvida. Uma fotografia não ficaria bonita, mas o tempo nublado instiga o fotógrafo que convive com o pesquisador sobre energia.Afinal, fotografia, energia, clima, tudo me leva a pensar em um plano, um roteiro, uma montagem cinematográfica.
Em um link recém aberto na Internet, leio sobre Escalas de Projeto:
“Investment theory generally assumes that the scale of one's investment in a particular asset or security is infinitely variable. In that case, the performance of a particular investment can be measured by its rate of return, a decision criterion that is independent of investment scale”.
Escala de projeto, investimento, desempenho, taxa de retorno são termos usados em planejamento. E fazer cinema também é planejar, fazer roteiro, realizar. Mas, pensar em retorno, ser escolhido o melhor em Gramado, em Paulínia ou no Rio de Janeiro, é uma longa caminhada. Mas é preciso fazer caminho ao andar.
Investimento eu faço, com minha preferência pela fotografia, sem pretensões, com minhas máquinas fotográficas. Minha primeira máquina fotográfica, de 1963, eu guardo até hoje, funcionando perfeitamente, sem pixels, quadrada, grande - comparada com as atuais digitais. Não me desfaço dela como não me desfiz de nenhuma das máquinas fotográficas que adquiri posteriormente.
Há alguns anos o meu interesse por fotogramas evoluiu naturalmente para o cinema. Qual equipamento escolher, quais técnicas usar, como manusear o equipamento, estas foram perguntas que surgiram. O vídeo, o zoom, a continuidade, as dificuldades com o som, a iluminação, a edição também apareceram como desafios.Para saber o que eu queria, fiz um curso básico sobre edição, outros sobre fotografia e, agora, um curso sobre roteiro e linguagem cinematográfica.
Aos poucos, minha biblioteca foi recebendo livros sobre fotografia e cinema:
A Forma do Filme, de Sergei Eisenstein
A Linguagem Cinematográfica, de Jorge Monclar
Como Formatar o seu Roteiro, de Hugo Moss
Direção de Câmera, de Harris Watts
Cinema Digital, um novo cinema? , de Luiz Gonzaga Assis de Luca
Dicas Essenciais de Vídeo, de Roland Lewis
Fotógrafo, o olhar, a técnica e o trabalho, do SENAC
A pesquisa jurídica sobre energia limpa e seu aproveitamento para o bem do meio ambiente, que tanto tem me ocupado nos últimos trinta anos, agora se complementa com a energia incrível do fragmento e suas relações que “perdem todos os sinais visíveis da combinação, aparecendo com uma unidade orgânica”, conforme escreve Sergei Eisentstein.
Que as idéias, os planos, os roteiros e as montagens se concretizem em obras e que sejam premiados os melhores. Porém, todos são vencedores por participarem dessa dinâmica mágica que é o cinema.
As noites do mês de junho são encantadas. Pelo céu cheio de estrelas, pela lua no alto do céu. Pelas festas populares em homenagem aos Santos Antonio, João, Pedro e Paulo.
Durante dez dias, no adro da Igreja Matriz, dezenas de barraquinhas bem organizadas com suas comidas, jogos de pescaria e de argola. O leilão de prendas reunidas pelos organizadores e leiloadas pelo Felipe da Padaria – uma grande demonstração espontânea de como se motiva o cliente e como se apresenta a mercadoria.
- É um belo leitão assado, que acabou de chegar do forno da Padaria. Dez cruzeiros, doze, doze cruzeiros e cinqüenta centavos. Quatorze, para o Doutor Antonio. Quem dá mais? Sintam o cheiro... Quem dá mais? ... A festa só começava após o retorno da procissão do santo, que era organizada e seguia pelas ruas centrais da cidade, recitando cânticos e rezando o terço:
- Pai nosso... - Ave Maria...
Durante a procissão, todos seguiam encantados com tudo aquilo, pois havia um ar de misticismo, religiosidade e festividade. As mulheres usavam véus sobre as cabeças. Véus brancos para as solteiras e véus pretos para as casadas e viúvas. Os homens, em geral, usavam paletós e gravatas. O Padre Francisco, italiano, baixinho respeitado, dirigia o cortejo, auxiliado por um grupo de Filhas de Maria e Congregados do Coração de Jesus.
A grande preocupação dos organizadores das procissões e eventos festivos na Igreja era a existência da travessia da Estrada de Ferro Central do Brasil, pois o ramal ferroviário que ligava o Rio de Janeiro a Santos Dumont, em Minas Gerais, passava pelo centro da cidade, com seus três pares de trilhos. Sobre estes trilhos circulavam pessoas, sonhos e riquezas. Pessoas que utilizavam o melhor meio de transporte coletivo, o trem. Sonhos de quem buscava novos horizontes em outras terras, pois os trens chegavam a todos os lugares. Riquezas, pois o minério das terras de Minas já desciam as serras para as siderúrgicas recém instaladas.
Pela cidade passavam dois ramais ferroviários o da Central do Brasil e o da Linha Auxiliar, da Leopoldina. A Linha Auxiliar fazia um percurso distinto, passando por Inema, Werneck, Cavarú, Andrade Costa, Paty do Alferes, Miguel Pereira, entre outras estações, até chegar a Japeri, em direção ao Rio de Janeiro.
Nesta Linha Auxiliar estava a estação do Inema, onde o encantamento do mês de junho chegava ao seu clímax. Em uma capela na localidade, às margens da linha do trem, na noite do dia 23 de junho realiza-se a Festa do Braseiro, em homenagem a São João. Por tradição, um grupo de moradores arma uma fogueira na praça, com barracas de comidas e dança de quadrilha de São João. Um grupo de devotos, à meia noite, espalha as brasas da fogueira e, contritos, passam, vagarosa e confiantes, sobre uma extensão de brasas incandescentes de cerca de cinco metros. Eles passam e retornam pelo mesmo caminho. Sem se queimar. E a festa entra pela noite de São João até de manhã.
É por isso que digo que as noites do mês de junho são encantadas. Por suas estrelas, pela lua no alto do céu. Pelas festas populares em homenagem aos Santos Antonio, João, Pedro e Paulo. Pelas minhas lembranças de menino.
Este nosso Concurso Literário do GO está provocando novas e sérias dúvidas em minha noção do que seja um poema.
O que seria prosa?E poesia? Poesia é só o que apresenta emoção explicita? Só é poesia se falar de amor e sentimentos extravasados ou reprimidos? Só é poesia se a natureza for vista como um mundo encantado e onírico? A preocupação com o técnico e com a técnica desqualifica o poema?
Para tanto, busquei esclarecimentos em pessoas como Bruno Tolentino (citado por José Aloise Bahia) e Marcelo Tápia, em Cronocópios, local na Internet indicado por Ana Guimarães. Pesquisei, também, Ezra Pound, em ABC da Literatura (ed.Cultrix).
Bruno Tolentino considera que, com relação à poesia, não se deve indagar para o que ela serve, nem quais as suas funções. E que “não é provável que a função poética, existindo sempre, desde que existe a fala, tenha sido sempre um engano ou uma perda de tempo. Obviamente não é uma perda de tempo”.
Tolentino cita uma tese sobre os quatro estágios do discurso em Aristóteles que nos ajuda a compreender sobre a natureza da poesia, pois não há outro modo de conhecer o mundo, através da linguagem, senão por meio de uma mitopoética. A retórica, a dialética e a lógica de Aristóteles completam o processo que nos indica como organizar a linguagem de maneira inteligível.
Tolentino considera, ainda, que a poesia vem antes que a prosa como forma de linguagem. “Mas, o espírito de prosa vai aos poucos aparecendo. O espírito de prosa chega muito tarde na humanidade. E já chega quando a humanidade está se tornando repetitiva, redundante e perigosa. Quer dizer, quando o negócio está ficando cada vez mais impositivo, onde há cada vez menos perplexidade diante das coisas, existe cada vez mais certezas e ninguém parece acertar o passo”.
Para Tolentino, não existe civilização nenhuma em que essa mitopoética não tenha se manifestado; que esse primeiro momento de percepção não tenha sido manifestado em linguagem, a poesia, a poiésis do grego - o “fazer novo”, que existiu tanto no meio dos chineses como dos hindus; em geral, no meio das grandes civilizações.
Segundo Marcelo Tápia, ao questionarmos a existência da poesia, teremos dois caminhos: ou responder, de imediato, com um simples e indignado “sim”, ou iniciar uma discussão que certamente não cabe nos limites de um texto simples.
Tápia cita que, segundo Ezra Pound os poemas podem ser classificados como “logopéias” - as modalidades de poesia que enquadra os textos analisados naquela categoria em que prevalece a “dança do intelecto entre as palavras”; a “melopéia”, que compreende a prevalência da musicalidade sobre outros aspectos; e a “fanopéia” - quando há prevalência da força das imagens.
Assim, a qualificação de um texto dependeria de uma época ou comunidade, pois o poético é, na verdade, uma estratégia de leitura, uma maneira de ler e, não, um conjunto de propriedades estáveis que objetivamente encontramos em certos textos - conforme Rosemary Arrojo, citada por Tápia.
Pensando em interpretação, construção e desconstrução - conforme Tápia, assim como em Ezra Pound e outros estudiosos, ao ler um texto “poético”, buscamos dimensões de sentido compatíveis com a própria idéia de poema, como a ambigüidade, que pode dar origem a um sentido inesperado, insólito; buscamos um texto em que todos os seus elementos devem ser considerados - conjunto de associações, no processo interpretativo. É possível, assim, alcançar conclusões diversas e também verdadeiras, ao se considerar que não há, do ponto de vista da desconstrução, verdade original ou estável.
É preciso estar preparado para observar os elementos não-verbais do texto, que formam sua estrutura rítmica e sonora. Faz-se necessário buscar no poema mais do que ele quer expressar, para realizar uma sua leitura poética, assim assimilando a função poética da linguagem. A função poética da linguagem compreende a percepçãode um contexto com códigos não verbais, como os musicais, os visuais, os gestuais. São as formas, que estão muito além do conteúdo. É preciso ler poesia como poesia, indo além da estética tradicional da prosa.
E, assim, eu continuo buscando, como se me iniciasse lá pela mitopoética, para alcançar a dialética, a retórica e a lógica; para bem entender as logopéias, as melopéias e as fanopéias. E, então começar a compreender o mundo dos poetas.